Afirma-se frequentemente que Freud aprendeu com as
histéricas, que a partir do tratamento delas criou o método
psicanalítico. O que se pode perceber pelos textos chamados pré-analíticos
(e que para alguns comentadores já seriam analíticos!) é que ele pastou com
essas mulheres (e um ou dois homens) histéricas, primeiro tentando tratá-las
como neurologista, algumas vezes pegando Charcot como modelo, somente com a
hipnose. Depois começou a usar o método que Breuer usara com Anna O. (método catártico com uma única paciente?) em 1882, e que sabemos em que fim deu.
Combinar hipnose com sugestão - o aclamado método
catártico - resolvia para alguns casos de histeria, mas Freud se viu em maus
bocados com outros casos em que os sintomas ou respondiam temporariamente ou
não respondiam de jeito nenhum! Boa parte das histéricas não se deixava
hipnotizar (por conhecerem a técnica, por não quererem ser hipnotizadas e
porque Freud talvez fosse realmente um péssimo hipnotizador!) e outras não
aceitavam as sugestões dadas por ele, seja no estado de sonambulismo ou fora
dele.
Foi somente a partir da famosa frase de Emmy von N.
em 1888 (talvez não tenha sido somente uma Emmy, mas várias delas a dizerem
frase semelhante!), solicitando que ele parasse de perguntar tanta coisa, qual
o motivo disso, qual o motivo daquilo, e
a deixasse falar livremente, foi que ele percebeu que não necessitava mais da
hipnose, bastando deixar a paciente deitada confortavelmente para
auxiliá-la em sua concentração.
Como resquício da hipnose, ainda usava uma técnica
que aprendeu com Bernheim, que era pressionar a testa da paciente,
sugestionando que ela iria encontrar a causa do seu sintoma e que deveria falar
sem censura tudo que surgisse em seu pensamento. Tinha surgido a regra de ouro
da futura psicanálise: a associação livre, mas que ainda demoraria algum tempo
para ser teorizada.
Portanto, continuou usando de sugestão por alguns
anos, pois ainda acreditava que dessa forma poderia dar conta dos sintomas, com
o objetivo de extirpá-los. O que ficou evidente depois é que bastaria a
paciente falar de sua vida como um todo, e não somente tentar lembrar das cenas
traumáticas que seriam a causa de seus males, para ocorrer abreação com
remissão dos sintomas.
Incentivando a associação livre, pontuando a fala
das pacientes, reconhecendo a existência de material que não estava acessível à
consciência e da qual a paciente não se dava conta, estava o caminho preparado
para a "descoberta" do inconsciente (como substantivo, pois como
adjetivo ele já era reconhecido pela filosofia!) e um método totalmente
psicológico que Freud somente alguns anos depois denominaria de psicanálise. No
Entwurf (1895, em que inicialmente somente seu amigo Fliess teve acesso) a estrutura do
inconsciente está praticamente formalizada, sendo trazida a público somente no
capítulo 7 da Interpretação dos Sonhos. Complexa, juntando biologia com
psiquismo, dá conta do caminho percorrido pelas representações, tanto com seus
representantes percorrendo livremente a via até a consciência, quanto as
possibilidades de recalque, com a escolha de novos representantes, que podem
aparecer em atos falhos, lapsos, sonhos e, em grande parte, em sintomas.
O que Freud aponta nos Estudos sobre Histeria é que
o tratamento para esse tipo de neurose tinha longa história, mas que até aquele
momento (em que ele e Breuer começaram a tratá-las - ou em que ele começou!)
nada se teorizava a respeito. Apesar de haverem livros publicados por Charcot,
Bernheim, Janet e outros, ele não considerava isso teorização, pelo menos como
ele estava fazendo naquele momento. E com certeza o grande diferencial de Freud
foi perceber e acreditar na etiologia sexual das neuroses e apontar questões de
linguagem presentes (deixar a histérica falar e pontuar falhas nessa fala), o
que provavelmente o levou a melhores resultados com relação aos sintomas
presentes nelas. Com a teorização sobre o inconsciente, recalque,
transferência, sublimação e outros conceitos, a teoria psicanalítica fazia todo
sentido.
Depois veio a interpretação dos sonhos, que já caminhava
durante os Estudos, pois Freud anotava seus sonhos e tentava encontrar sentido
para eles. Nesse texto ele vai trabalhar basicamente a estrutura do recalque,
do caminho das representações.
Nos textos teóricos posteriores (Psicopatologia da
vida cotidiana e Os chistes e sua relação com o inconsciente) ele vai
aprofundar a relação da linguagem com os sintomas e o inconsciente.
Nos textos de prática, como "caso Dora",
ele aprofunda a questão da transferência e associação livre, assim como a
ligação do afeto com as representações.
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